sábado, 4 de abril de 2009

A idéia
O projeto teatral HILDA HILST “O Espírito da Coisa” nasceu de madrugada... Domingo de 1998... Um telefonema da amiga querida, atriz e hoje diretora Imara Reis. Inspirada por uma matéria de jornal sobre Hilda ela teve a percepção brilhante e generosa - como só Imara pode ter - da ressonância e do encantamento que desde jovem tenho pelo temperamento artístico da escritora e por seu universo profundamente apaixonante e apaixonado. Sentia uma grande tristeza por Hilda ter seu trabalho pouco conhecido pelo grande público, embora exaltado e admirado pela crítica especializada. Naquele período, final dos anos noventa, ainda não havia sido lançada a reedição da obra de Hilda nem sua distribuição pela Editora Globo, que efetivamente se concretizou a partir de 2001, melhorando a proximidade do leitor com sua obra. A necessidade e o desejo de homenageá-la, resgatar um pouco da vida e da vasta, vertiginosa e imortal obra desta grande mulher e escritora brasileira tomaram conta de mim!
Quem foi Hilda Hilst? Qual a importância da obra de Hilda para a literatura? Hilda sempre foi reconhecida pela crítica como grande inovadora da escrita e sua mistura de gêneros e seu constante fluxo de pensamentos e imaginação garantiram uma obra profunda e peculiar, única! Hilda é dízima, é polifonia literária.
Iniciei então minha pesquisa naquele mesmo ano, (re) visitando o pouco que havia disponível de sua obra e de informações sobre sua vida nas livrarias, sebos e internet. Panorama que mudou muito nestes quase dez em que a idéia foi concebida, a pesquisa iniciada, a o material colhido, o texto escrito, atividades paralelas pensadas e os recursos para a execução do projeto negados pelo menos nos últimos cinco anos. Tanto pelos órgãos públicos quanto pela iniciativa privada. Mas está é uma outra estória, porque agora uma das maiores vozes da literatura brasileira ganha cada vez mais eco. Ela mesma dizia “Não há silêncio bastante para o meu silêncio”!
Como levaria ao teatro essa mulher e multifacetada escritora que faz reflexões imprescindíveis sobre os grandes temas universais e da modernidade? E que certamente traria ao palco um sopro de energia poética que chegaria ao público com a força e o encantamento natural dos grandes autores. Encomendar um texto de outro escritor para falar sobre ela e seu universo, encenar uma de suas nove peças, a maioria ainda inéditas, pensar na adaptação de um só de seus textos em prosa ou apresentar um recital de poesia, me pareceu reduzir a possibilidade de navegar pela grandeza de sua herança de palavras, sons, sentidos múltiplos e ambivalentes. Ir além me parecia fundamental.
Para traçar um perfil de seu universo pessoal e literário compreendi que ninguém seria melhor que a própria Hilda - na sua palavra já lapidada em seus trabalhos, nas declarações de seus parceiros e amigos mais próximos e verdadeiros - e nas entrevistas que concedeu à vários meios de comunicação. Era impossível separar a obra de Hilda e sua pessoa. O material selecionado para o texto da peça deveria então ser compilado como um “diálogo entre criador e criatura” de forma a revelar as diversas faces da escritora que ressaltariam aspectos essenciais da pessoa e da mulher. Minha vontade era não só a de expor a riqueza da experiência estética da escritora ou o espírito ousado da mulher que sempre esteve muito além do seu tempo; que “desdenhou literal e figurativamente das vírgulas”; mas fazer-se ouvir uma voz extrema e humana carregada de uma lucidez capaz de nos atingir a medula. Fazer ressoar sua palavra; sua visão transcendente e metafísica do mundo, afirmada por todos os questionamentos que marcam sua vida e obra e assim cintilografar sua alma, através de um “jogo de luz e sombra onde os opostos se atrairiam”. Reapresentá-la aos que já a conheciam e admiravam e apresentá-la aos que ainda não tinham tido o privilégio de conhecer a beleza de sua “Grande Face”!
Como atriz, mais do que fazer um trabalho de composição era meu desejo também poder transportar para o palco “as vozes de sua voz, as faces de sua face, a alma de sua alma”. Iluminá-la em sua essência pessoal e literária, estimular e promover o reencontro do público com sua obra e revelá-la em seus mais altos vôos da livre expressão criativa. Desejos mais do que afeitos à arte teatral.
Seus escritos proporcionariam ao espectador o que já acontece com seus leitores – um profundo mergulho na alma humana. Hilda Hilst será sempre lida nos vãos e desvãos de cada um de nós, pois encontrou a imortalidade de seu espírito através da palavra!
Rosaly Papadopol

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